quinta-feira, 26 de junho de 2014

Polícia Militar não atua dentro dos estádios na Copa do Mundo de Futebol - 2014 (Ou: "Os MATA-CACHORROS brasileiros somente "apitam" em jogos de periferia")



A Copa do Mundo de Futebol - 2014 é a prova cabal de que a Polícia Militar dos Estados da Federação não deve atuar no interior dos estádios de futebol. É incontestável que  os campeonatos de futebol são eventos particulares, mas, após a Copa, os "mata-cachorros" e "paus mandados" brasileiros voltarão a trabalhar no interior dos estádios, para as Federações Estaduais de Futebol, como se nada tivesse ocorrido.

Eis um descarado DESVIO DE FUNÇÃO que as autoridades fingem não ver.

Talvez devamos exigir um Ministério Público PADRÃO FIFA!

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Chico Buarque: 70 anos de poesia (ou "O Chico é eterno!")



A Arte é um tipo de conhecimento que transita no terreno arenoso das paixões, da sensibilidade, da intuição, do aspecto mais fluídico do Ser. A Filosofia e a Ciência, diferentemente, perquirem os aspectos estáveis da realidade, utilizando um discurso lógico e rigoroso, quase dogmático, movidas pela crença na posse de um conhecimento objetivo (universal e necessário). A Arte, ao revés, tem a seu favor a liberdade de expressão (com contradições e tudo), por isso está mais próxima da vida, tornando o artista um arauto capaz de dizer: ali está o real, sem qualquer necessidade de demonstração.

O poeta e escritor Francisco Buarque de Holanda é, por excelência, a personificação do artista no sentido estrito do termo. É capaz de sintetizar numa frase aquilo que filósofos e cientistas não conseguem em tratados inteiros. Chico é irreverente, ousado, rigorosamente desordeiro. Sabe que a ordem é produto do intelecto humano e a vida – o seu verdadeiro objeto – não tem regras preconcebidas, e que, para capturá-la, é preciso lançar a rede ao desconhecido sem saber o que nela virá.

Chico quando olha para a sociedade sempre a inverte e subverte. Fala do guri e do pivete de forma não institucionalizada. O menor infrator não é somente um delinqüente, mas alguém que vive a vida em suas limitações, fraquezas e ilusões. A meretriz, filha do desprezo, ironicamente precisa conter o asco de dormir com um nobre forasteiro para redimir uma cidade inteira. O que é o justo e o correto? O poeta não diz, apenas nos atormenta com suas insinuações.

Quando fala do sentimento feminino, não o faz buscando definições universais com descrições exatas e idealizadas, mas retrata a mulher individual, imperfeita, que sofre com a submissão; que se desespera e chora baixinho atrás da porta ao ser abandonada. Que espera o marido no portão todo dia, fazendo tudo igual. Fala também de uma mulher forte, que leva o sorriso da gente e é capaz de encontrar outro “mais e melhor”, como quem diz: “não se mirem no exemplo das mulheres de Atenas”.

Chico sabe que não é preciso ser filósofo para ver o que está ao redor dos acontecimentos. Quando se vai contra a correnteza, a roda viva (o sistema) nos leva “para lá”. Que o malandro - na dureza - não é julgado, condenado e culpado pela cachaça consumida indevidamente, mas pela situação, pelo contexto, que como um turbilhão faz o que quer com o nosso destino.

Mas o poeta, ao mesmo tempo, ri e brinca com o próprio destino, culpando-o ironicamente das nossas imperfeições e desditas; das nossas condutas transgressoras, sugerindo que não há um anjo malvado ou um chato de um querubim capaz de nos fazer bons ou ruins; nem um Deus gozador que se compraz em nos colocar em situações embaraçosas, porque a vida é responsabilidade nossa, enquanto seres livres e conscientes.

Chico, mais uma vez, desbanaliza o cotidiano nos dizendo que não é na Lapa que está o verdadeiro malandro, mas em algum lugar do serviço público, com gravata, mulher, tralha e tudo. E que apesar dele, amanhã há de ser outro dia. E se esse dia chegar, não será obra do acaso, mas daqueles que nada tem a perder para ousarem formar um verdadeiro cordão contra os poderosos. Porque a vida tem sempre saída. A vida tem sempre razão.

A palavra é a matéria prima do artista. Ele a toma em suas múltiplas possibilidades para nos dizer simplesmente que elas são apenas palavras, nada mais. Capazes de ser utilizadas nas mais estrambóticas situações, “só por ouvir dizer”. Mas sabe, ao revés, que elas têm o condão de criar a realidade, como o artista cria as metáforas. Cala-se, dizendo. Diz em silêncio, “porque a dor não passa”. Porque a condição humana é simples e cruel.

Quando ele fala de amor, parece querer nos confundir. Desdenha do grande amor mudando de calçada; mas, de repente, sente o peito arder de desejo ao ver Cecília passar. Chico não fala de um amor atemporal – pretensão dos filósofos – mas de um sentimento mundano que nos faz contar segredos lindos e indecentes; ou que nos deixa paralisados ao ver a amada saindo do mar. O poeta denuncia a instabilidade do espírito humano, "que ri e chora, que chora e ri".

O Chico é isso e muito mais, porque com a sua arte nos faz duvidar das crenças do dia a dia, nos provoca, nos deixa inseguro e depois nos conforta com uma linda canção de amor. Porque a verdade não é o seu tema. O seu objeto é, simplesmente, a vida.


Parabéns ao Francisco, porque o Chico é eterno!

terça-feira, 3 de junho de 2014

A mentalidade ordinária

O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) considerou "desrespeitosa" para as mulheres a propaganda do Bom Negócio em que Compadre Washington fala o já famoso bordão "Sabe de nada, inocente" e determinou que seja alterado um trecho do comercial.

A expressão considerada ofensiva é "ordinária", dita pelo cantor no meio da propaganda. No filme, Washington desaparece antes de terminar de falar a palavra. O Conar entendeu, porém, que o termo fica "perfeitamente compreensível" para o público.

Sem dúvida alguma o termo “ordinária” foi empregado em sentido pejorativo, denotando algo como “vadia”, “vagabunda” ou qualquer outro conceito relativo à falta de atributos morais da personagem feminina do comercial, mas é preciso reconhecer que o emprego desse termo é perfeitamente coerente com a ideia geral que o discurso se propôs a transmitir.

Para quem não assistiu a propaganda vou, na medida do possível, sintetizá-la: “Uma bela mulher vai entrando numa piscina e o marido está sentado numa cadeira, na pérgola. Washington, personalizando um aparelho de som, inicialmente elogia os atributos físicos da mulher. Depois, dirige-se ao marido ressaltando a sua ignorância sobre o comportamento moral da esposa. Em seguida a chama de ordinária. Neste momento a imagem de Washington desaparece, significando que o objeto baldio, por ele representado, foi comercializado. ”    

É preciso considerar que a personagem representada pelo Compadre Washington tinha de ser inconveniente e contundente na maneira de se expressar para “justificar” a vontade de o proprietário vender o objeto por ele representado. A palavra ORDINÁRIA, portanto, foi empregada num contexto totalmente lógico e sistemático. Somente se fizermos uma ampliação apressada desse conceito e o retirarmos do contexto onde foi empregado é que podemos considerá-lo ofensivo ao gênero feminino como um todo, o que, indubitavelmente, não foi o caso.   

Mas o que parece relevante nessa pendenga é o fato de algumas pessoas entenderem que a propaganda precisa ser modificada e a palavra “ordinária” retirada para que o comercial continue a veicular normalmente. Ao revés, penso que o cerne da questão não está na propaganda em si, mas na maneira de interpretá-la. O preconceito nunca está no discurso, mas na incapacidade de o sujeito perceber a sua inconsistência, ou seja, somente os “burros” acreditam nas mais estapafúrdias combinações de palavras.

Se alguém diz que as loiras são “burras”, por exemplo, “burro” é ele próprio que não conseguiu perceber que a cor do cabelo nada tem a ver com a habilidade intelectual de alguém. Uma sociedade inteligente não faz restrições ao uso de certas palavras, mas habilita os seus integrantes a compreender o verdadeiro alcance e sentido das mesmas, e assim não se deixem impressionar com combinações equivocadas de conceitos. 

Por essas e outras a palavra “ordinária”, empregada na propaganda do site de compras Bom Negócio, jamais poderia ser censurada, porque no fundo e no fim quem de fato é ordinária é a mentalidade de quem confere às palavras significados que elas nunca possuíram.